quarta-feira, 30 de julho de 2014

CARTA PARA TUTÓIA


Em 2007 fiz o meu último passeio com mais de 1000 km.
Estava eu jogando dominó com alguns colegas perto de casa e falei que estava com vontade de dar uma volta de bicicleta de uns 2000 km, pois eu visualizei uma folga no trabalho de mais ou menos duas semanas.
Um dos parceiros, o Nilsão, perguntou se eu não poderia levar uma carta para a irmã caçula dele que estava morando em Tutóia,  lá no cantinho do Maranhão, pertinho de Parnaíba.
A distância até Tutóia, 1.070 km, encaixava no meu projeto. Aceitei a encomenda. Ajeitei minhas coisas e levei 150 reais para gastar no percurso, e, se o dinheiro não fosse suficiente, eu já tinha muita prática em viver sem dinheiro.
No primeiro dia fui até Santa Luzia do Pará (200 km). No segundo, Santa Luzia do Paruá-MA (+ 200 km). No 3º, Igarapé do Meio  (+200 km). No 4º, Itapecuru-Mirim (+118 km). Neste dia o vento contra dificultou o meu deslocamento. Tive dificuldade para urinar, sendo que só consegui depois de beber 3 copos de cerveja como se fosse água. Em Miranda, uma mulher da lanchonete onde parei falou que, quando faz muito calor, ela não consegue urinar, e, pesquisando na internet, posteriormente, pude comprovar esta relação entre calor e dificuldade. Em Itapecuru-Mirim, no posto de gasolina onde dormi, estava um grupo de vendedores de redes, gente de Catolé do Rocha e São Bento-PB. Um deles, ao notar minha falta de habilidade para colocar a rede, me ajudou e a instalou com incrível destreza. Porém, uns 20 minutos após todos estarmos deitados para dormir, uma rede escapou e caiu; era a do vendedor que me ajudou.
 No 5º, Chapadinha. Neste dia, também, vento contra. Entrei em Vargem Grande com vontade de comer. No mercado público, já depois do meio-dia, perguntei onde poderia encontrar uma refeição. Uma senhora perguntou se poderia ser ovo frito com farinha e eu disse ¨sim¨. Assim que comi, senti as minhas baterias sendo carregadas do mesmo jeito que numa outra viagem que ganhei também ovos com farinha perto de Chapadinha. No posto de gasolina, em Chapadinha, à noite, liguei a cobrar para minha casa e pedi para mandarem uma mensagem para o telefone celular da irmã do Nilsão, informando que eu chegaria lá ¨depois- de- amanhã¨, mais ou menos ao meio-dia. No 6º dia, dormi num posto de gasolina num lugar chamado Fazenda Mamorana, e, no sétimo dia, faltando uns 70 km para chegar em Parnaíba, entrei à esquerda, passei por Canabrava e Barro Duro e cheguei em Tutóia poucos minutos depois das onze horas. Da minha casa até aí, só asfalto.
Encontrando a residência da irmã do Nilsão, entreguei a carta e perguntei se ela havia recebido a mensagem no telefone celular. Ela, estranhamente, disse que não havia recebido nada, mas  esclareceu que a tal mensagem levaria mais uns 3 ou 4 dias para chegar. A operadora era uma tal de Amazônia Celular. Disse, também, que usar telefone interurbano era quase impossível. Quando precisava ligar para alguém em outra cidade, pedia aos vendedores que visitavam o seu comércio para ligarem por ela quando retornassem a algum lugar onde o telefone funcionasse...
Moral da história: uma bicicleta velha pode ser mais rápida que uma mensagem via celular....
A  irmã do Nilsão estava recebendo visita de um pessoal da Igreja. Falei a ela que queria aproveitar ainda o restante do dia para começar a voltar para Ananindeua. Ela me indicou um restaurante próximo, disse para almoçar por conta dela e nos despedimos.
Almocei e fui direto ao local onde havia umas Toyota 4x4 que levavam as pessoas para Paulino Neves, a uns 30 km de Tutóia. Saí às 16:30 e cheguei ao anoitecer. Apesar de ser pequena a distância, havia muita areia na estrada e seria complicado pedalar. Paguei 5 reais.
Em Paulino Neves, lá mesmo onde desci, comprei iogurte e biscoitos e perguntei onde poderia encontrar outra Toyota que fosse para Barreirinhas.  Indicaram a residência do dono de uma Toyota, lá no fim da rua, e lá fui eu, já no escuro. Lá chegando, pediram que aguardasse a chegada dele, sendo que esperei só uns 10 minutos. Paguei logo a passagem para saída no outro dia bem cedo (10 reais). Perguntei por que de Tutóia  para Paulino Neves o preço era só 5, e ele disse que a distância para Barreirinhas era maior. Ele me convidou para jantar e depois fomos dormir, ele com a família e eu na Toyota.
Às quatro horas ele me acordou. Tomamos café e saímos. Andamos uns 20 minutos pela pequena cidade pegando passageiros e seguimos para Barreirinhas. Não havia estrada. A Toyota, além de ser 4x4, tinha os pneus mais largos e o percurso era por uma infinidade de dunas, muitas vezes passando de raspão ao lado de pequenas árvores, sendo que tínhamos que cuidar para não sermos atingidos por algum galho. Às vezes a Toyota encalhava e não conseguia avançar na areia. Então, engatava a ré, e voltava com mais força para vencer o trecho mais difícil. Chegamos em Barreirinhas às 8:10.
Entrei num mercadinho, comprei alguma coisa para comer e saí no rumo de São Luís, com vento a favor, sendo que consegui ir até Rosário, onde cheguei uns 30 minutos depois de anoitecer. Dormi num posto de gasolina.
No 9º dia, faltando 60\70 km para São Luís, contra o vento, andei com dificuldade e cheguei ao porto da balsa às 11 horas. A balsa já estava pronta para sair e a entrada acabava de ser fechada. Fui com pressa ao guichê para tentar comprar a passagem. Um guarda perguntou para onde eu queria ir. Disse a ele ¨Belém¨. Ele liberou a entrada e disse que não era necessário pagar!  Esta travessia era para um lugarejo chamado Cujupe e durou mais ou menos uma hora. A balsa era da Marinha do Brasil.
Descendo da balsa, andei mais uns 80 km e cheguei a Pinheiro, onde passei a noite na casa do Sr. Ubaldo, conhecido de outras viagens.
No 10º dia, entre Maraçumé e Cajueiro, parei para ajudar a dois caminhoneiros a colocar um muito pesado motor elétrico que havia caído no asfalto e que eles não tinham força para levantar. Eu, com a minha desprezível força, ajudei e conseguimos colocá-lo de volta no caminhão. Insistiram muito em me dar uma carona, mas eu falei que já estava perto de casa...
Em Cajueiro fiz uma rápida visita ao Sr. Zé Fortino, visita obrigatória em todas as minhas passagens pelo lugar. Fui dormir no posto Pombal, em Gurupi, na divisa com o Pará.

No 11º dia, fui até Santa Maria do Pará (+ 180 km). E, no 11º dia, mais 100 km,  cheguei de volta para a minha casa.

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