terça-feira, 24 de março de 2015

Minha primeira grande viagem (Ubatuba\Angra dos Reis) (9ª parte)

01\01\84. Acordei às oito horas. Agradeci a hospitalidade, me despedi e segui rumo a Parati. Foram 72 km numa estrada de serra. Durante a viagem, numa parte do acostamento, vi dois morcegos mortos. Tomei banho em duas fontes. Achei um pacotinho contendo onze bolachas, as quais  eu comi sem cerimônias. Cheguei a Parati às 14 horas. Estava bastante cansado e com fome. Parati era uma cidade muito antiga. Prédios com mais de 200 anos eram comuns. Na rua havia muitos turistas, os quais faziam contraste com o povo simples que lá morava. Passei em algumas casas e ganhei pão, bananas, laranja, maçã e manga. Comi pão e frutas. Sobrou pão. Dei umas voltas, sentei em frente a uma igreja e atualizei o diário. Em seguida, bati uma foto e fui pedir alimentos.


 Passei numa casa e ganhei um prato com feijão, arroz, carne e batatas e uma laranja de sobremesa. Depois, ao anoitecer, fui até o Corpo de Bombeiros, onde combinei que passaria mais tarde para dormir. Passei em outra casa, ganhei um prato com feijão, arroz, bifes, salada de maionese e pimentão. Ganhei, ainda, uma grande fatia de torta “quero-mais” e quatro laranjas. Voltei ao Corpo de Bombeiros. Tomei um banho e deitei-me na sala, num colchão que fora colocado para mim. Os bombeiros assistiam TV. Fiquei deitado, mas o sono demorou a chegar.

02\01\84. Acordei antes das cinco horas. Havia um gato miando perto de mim. Sentei-me na escada em frente ao prédio e atualizei o diário, enquanto aguardava para tomar café. Tomei café e saí, por volta das 7 horas, rumo a Angra dos Reis. A estrada era muito bonita e ia acompanhando o acidentado litoral carioca, subindo e descendo morros. Numa fonte, fiz uma parada e tomei um banho. Mais adiante, num belvedere, comi um pouco de pão e duas laranjas. Passei também por uma central nuclear e alguns conjuntos habitacionais. Num posto de gasolina, comi o restante do pão e as duas laranjas.

 Em seguida, peguei a bicicleta e percorri os últimos km que faltavam para chegar a Angra dos Reis. Eu já estava no acesso à cidade, quando, estranhamente, acordei numa cama com meia dúzia de pessoas desconhecidas me observando.

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
As últimas linhas foram escritas quando eu estava no hospital. As pessoas contaram que fui atropelado e que entrei no hospital em estado de coma. Dei alta no dia 10\01\84 e tive de retornar a Venâncio Aires para me recuperar das lesões. No dia 22\02\84, estando já recuperado, viajei a  Porto Alegre, visitei alguns  amigos e planejei retornar a Angra dos Reis para reformar minha bicicleta e prosseguir viagem. Cheguei a Angra dos Reis no dia 28\02\84. Fui até a casa do casal que me socorreu quando fui atropelado. O vizinho informou que eles estavam em Monsuaba. Peguei a bicicleta que estava lá e levei até uma oficina. O mecânico combinou comigo que a reformaria até o dia 01\03. Em seguida, fui até a casa de Maria Tereza e Heraldo, que conheci quando estava hospitalizado. Heraldo estava sozinho em casa. Maria Tereza e o filho estavam no Rio e voltariam depois do carnaval. Fiquei hospedado na casa de Heraldo. Ocupei meu tempo jogando xadrez, indo à praia e passeando pela cidade. No dia 01\03, à tardinha, retirei a bicicleta da oficina.
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

domingo, 8 de março de 2015

Minha primeira grande viagem (Bertioga\Ubatuba) (8ª parte)

29\12\83. Acordei cedo. A esposa de Gerhard convidou para tomar café. Em seguida, ela leu meu diário. Enquanto ela lia, Gerhard estava ajudando um vizinho a espalhar leivas de grama. Eu escrevi aerogramas para Jerônimo e Sr. Braga.  Depois, me despedi do pessoal, despachei os aerogramas no correio, fui à praia, tomei um banho e segui viagem.

Andei pela areia da praia. Passei por várias praias. Vi muitos carros com placas de Mogi das Cruzes e vi muitos japoneses. Na medida em que eu andava, o mar ia ficando verde-escuro. A espuma das ondas parecia mais branca. Antes de chegar a uma praia, havia um desvio. Não entrei  no desvio. Continuei pela beira da água e cheguei a um pequeno braço de mar, de uns 12 m de largura. Atravessei-o carregando a bicicleta. Era mais fundo que eu calculei. A água salgada atingiu todas as engrenagens. Quando cheguei do outro lado, vi muitos caranguejos, marrons e grandes. Depois daquela praia, peguei uma estrada de areia e andei uns 30 km. Quando eu passava por alguma ponte, observava que a água era bem preta. Depois, andei alguns trechos de asfalto e estrada de terra. Passei por algumas praias que eram separadas por morros.

 Depois de uma chamada Boiçucanga, subi um morro muito alto, por uma estrada cheia de pedras. Um caminhão vazio, por falta de potência, andou alguns metros para trás para embalar num determinado ponto da subida. Quando comecei a descer, constatei que o freio da bicicleta estava estragado. Quando era acionado, a roda trancava bruscamente e o cubo rangia. Parei. Pus o dedo no cubo e quase me queimei. Tive que descer o morro a pé. Cheguei a uma praia chamada Maresias. Havia muitas casas grandes, bonitas e com muros e portões bem altos. Continuei. Subindo e descendo morros, empurrando e segurando a bicicleta. Aliás, neste dia, descobri que descer segurando a bicicleta é mais difícil que subir empurrando.

Numa dessas descidas, deixei a bicicleta correr. De repente, os pedais começaram a girar sozinhos e eu tive que tirar os pés. Lá embaixo, uns 200 metros à frente, uma curva fechada. Com medo de não conseguir dominar a bicicleta, optei por jogar-me no barranco, num ponto onde havia terra fofa. Não me machuquei. Apenas fiquei muito sujo e a bicicleta entortou a direção, que corrigi facilmente sem usar ferramentas.

 Quando eram quase 21 horas, muito cansado e faminto, cheguei a um lugar chamado Barequeçaba. Pensei ter chegado a São Sebastião, mas ainda faltava mais um morro. Eram apenas 6 km, mas eu estava liquidado. Fui a uma mercearia. Comprei leite, bolachas, duas latas de sardinhas e uma lata de milho. Tomei todo o leite, comi uma lata de sardinhas e um pouco de milho e dei-me por satisfeito. Um rapaz, José Carlos, com quem eu conversava, disse que poderia consertar minha bicicleta no outro dia. Em seguida, fui até a delegacia de polícia pedir pernoite. O sargento que me atendeu disse que havia dois presos na cela e que estava sendo realizada uma busca a ladrões e provavelmente haveria mais presos naquela noite. Fui até uma escola que alguns jovens me indicaram. Falei com o Sr. Luiz, que morava nos fundos e cuidava da mesma. Consegui dormir numa grande mesa que estava numa área coberta. Vesti o blusão, a calça de veludo e usei uma toalha para me proteger dos mosquitos.

30\12\83. Luiz me acordou de manhã cedo. Tomei um copo de café que ele me ofereceu. Conversamos um pouco e saímos. Ele foi trabalhar e eu fui à praia. Tomei um banho no mar. Em seguida, comi o milho da lata e algumas bolachas. Fui em direção á casa de José Carlos. Sentei-me num banco da parada de ônibus, conversei um pouco com um rapaz e atualizei o diário.  A parada era ao lado da casa onde José Carlos morava. Passaram-se alguns minutos e ele apareceu. Levei a bicicleta e José Carlos pegou uma caixa cheia de ferramentas e peças usadas. Desmontou o cubo traseiro da minha bicicleta e verificou que o bronze que freava a roda estava quebrado em duas partes e tinha uma rachadura. Pegou um idêntico em sua caixa e fez a substituição. Explicou que era necessária uma boa lubrificação, a qual ele não poderia fazer, por falta de graxa. Quis pagá-lo, mas ele se recusou a receber o meu dinheiro.

 Agradeci e fui até São Sebastião. Lá chegando, após alguns minutos, encontrei uma oficina de bicicletas. Pedi para lubrificarem e paguei com os mil e quinhentos cruzeiros que restavam. Fui até uma praça e comi as sardinhas. Depois, dei umas voltas e entrei numa loja de jogos eletrônicos, onde fiquei conversando com alguns rapazes. Um moreno, que cuidava da loja, me deu um copo com refresco. Depois fui até outra praça, grande e arborizada. Tirei uma soneca num banco. Tomei um banho e fui pedir algo para comer.  Numa casa ganhei laranjas, noutra um prato de comida e noutra um sanduíche com carne. Dei umas voltas, comi as laranjas e fui até a beira do mar onde permaneci até anoitecer. Observei as pessoas que passeavam na praça. À medida que anoitecia, um vento que vinha do Norte aumentava de intensidade.  Algumas crianças estavam brincando na água. 

 Antes de escurecer, fui pedir mais alguma coisa para comer. Ganhei sanduíches, bolo, laranjas e iogurte. Voltei à prainha da praça, tomei um banho. Vi um obelisco e constatei que São Sebastião existe desde 1636. Havia muito movimento na praça. Sentei num banco, de frente para a avenida. Conversei com um rapaz de São José dos Campos e, durante a conversa, comi tudo o que tinha na caixa. Em seguida, fui até a delegacia de polícia, onde me autorizaram a dormir num carro que estava no pátio. Guardei a bicicleta na delegacia e fui dormir. Eram 21 horas.

31\12\83. Acordei bem cedo. Esperei bastante tempo até que a delegacia abrisse. Quando abriu, entrei lá e peguei a bicicleta. Fui convidado para o café. Após o café, fiquei um longo tempo conversando com um agente de polícia. Segui viagem rumo à praia de Ubatuba. Tendo andado alguns km, o pneu traseiro furou num pedacinho de vidro branco.  Fiz o remendo e segui.

 Chegando a Caraguatatuba, tomei um banho no mar. As ondas eram fortes e a água estava suja. Dei umas voltas pela cidade. Cheguei a uma casa bem grande e pedi algo  para comer. A empregada que me atendeu informou que eu deveria esperar até que o dono me atendesse.  Enquanto esperava, atualizei meu diário. Chegaram dois homens e expliquei a eles a razão de estar ali.  Três minutos depois, a empregada trouxe para mim um prato com pão, carne e batatas e um copo de leite. Fiz a refeição, agradeci e segui viagem.

 Numa praia chamada Lagoinha,  tomei um banho de mar. Em seguida, pedi alimentos numa casa. Comi um pão com berinjela. Depois comi um prato de comida. Seguindo viagem, tomei um banho numa fonte à beira da estrada.

 Passei por algumas praias muito bonitas e cheguei a Ubatuba. Praia bonita, cidade bonita, gente bonita. Numa casa ganhei uns sanduíches. Noutra, onde morava um homem de 77 anos de idade, com o qual conversei um pouco, comi feijão, arroz e ovos fritos.  Este senhor disse que era professor e que nunca havia saído de São Sebastião. Depois, já escuro, ainda passei em duas casas, onde consegui um sanduíche, uma laranja e três pãezinhos. Sentei-me num banco à beira do mar e comi. Pude notar que na areia havia alguns siris. Minutos mais tarde, vi uns meninos pegando os siris com a mão e colocando-os num saco plástico. Vi também umas velas acesas debaixo de um banco. Após ter comido, fiquei a um canto da calçada, em cima da bicicleta, e atualizei o meu diário, em meio ao grande movimento de automóveis e pedestres que passeavam de um lado para outro.

 Em seguida, fui procurar um local para dormir. Consegui pernoite na Polícia Militar, num sofá do refeitório. Fui dormir às 22:30. Nesta noite estouraram muitos foguetes na cidade. Era passagem de ano. Num ginásio de esportes próximo, houve um baile de carnaval.


domingo, 1 de março de 2015

O trotinho

Correr bem devagar, com passinhos mínimos, como aquele atleta que eu vi treinando em Ivoti, é um exercício que eu faço hoje em dia.

Faço isso dentro de casa, na sala, correndo a menos de 5 km\hora num percurso em forma de 8 num espaço de 7 metros quadrados.

Experimente fazer isso durante 15 minutos. É uma verdadeira calibragem no corpo.


Eu costumo praticar o trotinho quando sinto falta de exercício e não quero sair de casa, como no final de domingo, uns 40 minutos.

O Laurinho corredor

Desde a infância, sempre gostei muito de correr. Correr a pé. Lembro, ainda no primeiro ano primário, quando, no colégio (Escola Gaspar Silveira Martins – Venâncio Aires\RS), ao ouvir a sirene para o recreio de 30 minutos, eu deixava o calçado na sala de aula e, descalço, ia correr ao redor de um pavilhão de festas que havia no pátio. Corria todos os trinta minutos e contava as voltas, mais de cem. Lembro que imitava estar dirigindo, fazendo o barulho do carro (um DKW) quando acelerava ou fazia as curvas. O João Arnoldo Rodrigues Machado, que era grandão e parecia correr caindo para frente, o Inézio Moretto, que parava de correr quando abria duas voltas de vantagem, o Gelson Gehres, alguns colegas corredores que recordo.

Depois, com mais de 10 anos de idade, comecei a levantar de madrugada e correr pelas ruas da cidade. Eram 60 ou 70 quarteirões, escolhidos na hora da corrida, todos os dias. Sempre menos de 10 km. Muitas vezes alguns vizinhos ou colegas corriam comigo, mas, na maioria das vezes, eu corria sozinho.

Um amigo da época, o Galvão, que era conhecido como galão, topou um dia, fazer um percurso para fora da cidade. O acesso ao trevo ainda estava em obras de aterro. Fomos correndo até lá, e, entusiasmados, queríamos correr até Mariante, mais de 20 km, mas acabamos desistindo e fizemos a volta pela estrada velha entrando na cidade ao lado do posto do prego (Sr. Nagel), no final da Rua 15 de Novembro. Eu fiquei com as pernas meio travadas por alguns dias.

Por ocasião de jogos escolares, o professor de educação física  escalava eu e o ¨Tarimba¨(Luiz Carlos Bienert) para a prova de 4 mil metros, sendo que o Tarimba, um corredor de verdade, ganhava quase todas as provas e eu, um trotador, chegava, pela desistência  dos outros competidores, em terceiro lugar, na melhor das possibilidades.

Numa competição estadual, só de colégios evangélicos, em Ivoti, fomos, em uma Kombi, doze atletas, mais o professor e o secretário da Escola, o Wilson Bender.  Fomos lá só para fazer turismo. Eu e mais uns quatro ficamos hospedados na casa do homem mais rico da cidade e fomos tratados com tanta mordomia que eu encabulei. Não havia prova de 4 mil metros. Só de 1500 e 800. O Tarimba foi escalado para os 1500 e eu para os 800. No dia da primeira prova, eliminatória, pela manhã, o professor  nos mandou treinar na pista de atletismo, a primeira que eu vi na minha vida. Vi lá uns rapazes correndo usando abrigo, novidade. Colégio da Paz, IPT, ....  Aquele do colégio da Paz corria tão devagar que eu, caminhando, ultrapassava. Para fazer graça, ainda dei várias voltas correndo de costas. A pista era menor que a oficial e, para fazer 800 metros, eram necessárias umas 3 voltas.
Por ocasião da prova, à tarde, largamos eu e mais sete.  Fiquei logo para trás. Quando eu estava terminando a segunda volta, estava sendo colocada a faixa na chegada, e, a plateia, desatenta, ou se divertindo, me incentivava ao me ver na frente de todos, mas com uma volta a menos. Passei por baixo da faixa e só não fui o último porque um caiu e outro desistiu ....
O Tarimba, na prova dele, chegou em terceiro.


Lembro ainda, que a mamãe deu 20 mil cruzeiros para alguma despesa e recomendou que eu economizasse, sendo que não gastei nada em 4 dias e ainda achei uns 2 mil no chão.